PIS/COFINS Sobre receitas financeiras

Por Adonilson Franco

Franco Advogados Associados

Publicado em 16/07/2019

Acompanhe o Boletim:

Há quatro anos escrevemos sobre o tema “Vantagens de ser S/A ou Ltda”. Nele discorremos sobre as vantagens das Ltdas sobre as S/As em relação a diversos aspectos, um deles, o PIS/COFINS sobre receitas financeiras.

Antes disso, no longínquo ano de 2004 já tínhamos abordado essa mesma questão, sob o título “COFINS – Receita Financeira – Não-incidência – Precedente do STJ”.

E a retomamos em 2015 debaixo do título “PIS/COFINS Receitas Financeiras – PIS/COFINS Importação – Medidas Judiciais”, para explicar que a retomada dessa tributação vinha acompanhada de ilegalidades e inconstitucionalidades.

Ante repetidas abordagens, por que voltar a ele novamente? Ao final responderemos a isso.

I – DECISÃO DO STJ

É que o STJ decidiu por maioria de votos da 1ª Turma, em 17.10.2017 (REsp 1.586.950), em decisão sem efeito vinculante, ser legal o aumento da alíquota do PIS/COFINS sobre receitas financeiras promovido pelo Decreto 8.426/15, suportado na Lei 10.865/04, art. 27, § 2º, que autorizou o Executivo a reduzir ou restabelecer as alíquotas sobre as receitas financeiras auferidas por Pessoas Jurídicas sujeitas ao regime não cumulativo de apuração dessas Contribuições.

Conforme será visto aqui, antes de ser negativa aos contribuintes essa decisão do STJ, ela é muito importante por confirmar a inconstitucionalidade.

Recapitulando: o Decreto 5.164/04 havia reduzido-as a zero. Na sequência veio o Decreto 5.442/05 mantendo-as em zero, incluindo operações de hedge.

O Decreto 5.442/05 foi revogado em 2015 pelo Decreto 8.426, o qual restabeleceu as alíquotas de 0,65% (PIS) e 4% (COFINS).

II – NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ)

A legalidade do Decreto 8.426/15 foi questionada no Judiciário e chegou ao STJ para analisar esse aspecto (legalidade), cuja análise enquadra-se dentro do âmbito de competência daquela Corte.

Ali foi apresentado pelo contribuinte como fundamento de sua tese que o restabelecimento da alíquota seria majoração dos tributos, vedado por Decreto em razão do Princípio da Legalidade que para isso exige lei formal.

A – VOTO DO RELATOR (VENCIDO)

Nessa decisão o Relator, Ministro Napoleão Nunes Maia foi voto vencido. Ele concordava com a tese dos contribuintes no sentido de que o Decreto violou o Princípio da Legalidade. Segundo ele, a redução da alíquota por Decreto (5.442/05) não autorizaria seu aumento por Decreto (8.426/15).

B – VOTO VENCEDOR (DIVERGENTE)

Entretanto, o voto vencedor prolatado pelo Ministro Gurgel de Faria do qual resultou maioria favorável ao fisco – e isso é muito importante saber –, foi no sentido de que a Lei 10.865/04 poderia ser considerada inconstitucional.

Porém como naquela Corte, como dito, analisa-se apenas a legalidade, não assim a constitucionalidade, dentro dos limites dessa análise o Decreto 8.426/15 teria observado a legalidade.

Entretanto, nesse voto divergente o Ministro observou que o princípio da legalidade foi desconsiderado na edição da Lei 10.865/04 uma vez que as exceções previstas no artigo 153, § 1º da CF , que faculta ao Poder Executivo alterar alíquotas de impostos, não incluem as Contribuições ao PIS/COFINS.

E prosseguiu:

“Não tendo sido observado o princípio da legalidade, a conclusão a que chegaríamos seria que a referida lei é inconstitucional, até porque por tal princípio, previsto tanto na Constituição Federal quanto no Código Tributário Nacional, o administrador também está impedido de reduzir tributos.”

Por essa razão entendeu o Ministro que declarar a inconstitucionalidade da lei acarretaria enorme prejuízo aos contribuintes, pois passariam a vigorar as alíquotas cheias previstas nas Leis 10.637/02 e 10.833/03 (9,25%), ao invés de 4,65% previstas no Decreto 8.426/15.

Como naquela Corte foi pedido o reconhecimento da impossibilidade de incidência do PIS/COFINS sobre receitas financeiras e não a inconstitucionalidade da Lei 10.865/04, a decisão se circunscreveu aos limites postos no pedido formulado na ação.

Uma vez presumida, então, constitucional a Lei 10.865/04, o Decreto 8.426/15 teria observado os limites autorizados por referida lei. É que seu artigo 27, § 2º , autorizou o Poder Executivo a reduzir ou restabelecer as alíquotas nos percentuais delimitados na própria lei. Assim, no raciocínio daquele Ministro:

“… se considerarmos legal a permissão dada ao administrador para reduzir tributos, também devemos considerar legal o seu restabelecimento pois não se pode compartimentar o próprio dispositivo legal para fins de manter a tributação com base em redução indevida.”

C – EFEITOS DA DECISÃO DO STJ

Sobressai dessa decisão do STJ um primeiro aspecto, de suma importância para os contribuintes: a Lei 10.865/04 que por seu art. 27, § 2º permitiu ao Executivo reduzir ou restabelecer alíquotas é reconhecidamente inconstitucional.

Segundo aspecto, é que os contribuintes não usaram de má-fé ao se beneficiar, sem reclamar, quando as alíquotas foram zeradas em 2004!

Simplesmente não tinham titularidade para agir em juízo por meio de medida judicial que contestasse essa redução. É claro que, ainda que pudessem, também não lhes interessava, convenhamos.

É premissa processual que para entrar em juízo é imperativa a demonstração do interesse de agir. O interesse de agir processualmente exige a concomitante demonstração da legitimidade e oportunidade da ação. Pode haver interesse e não ser legítimo. Pode ser legítimo, mas não ser oportuno (De Plácido e Silva).

Para ser legítimo, o interesse deve se mostrar individualizado em virtude do qual esteja seu titular investido da faculdade e capacidade para propor aquela ação. E a oportunidade tem a ver com a condição de o interesse ser atual.

Nesse caso de redução da alíquota para zero, o único que tinha interesse processual para agir contra ela questionando a constitucionalidade da Lei 10.865/04 era o Ministério Público, mas não o fez.

Terceiro aspecto, é que o pedido ao STF do reconhecimento da inconstitucionalidade do art. 27, § 2º da Lei 10.865/04 pode e deve vir acompanhado do requerimento de modulação de seus efeitos a ser promovido pelo contribuinte no Recurso Extraordinário àquela Suprema Corte.

Explicamos: os efeitos do reconhecimento, pelo STF, da inconstitucionalidade de uma norma jurídica, de rigor, retroagem à data da promulgação da norma, no caso, 30.04.2004.

Mas o contribuinte pode e deve pedir que os efeitos da decisão valham, por exemplo, a partir de julho/2015 quando, por força do disposto no art. 27, § 2º da Lei 10.865/04, as alíquotas do PIS/COFINS foram majoradas de zero para 4,65%.

Isso é permitido pelas regras aplicáveis à modulação dos efeitos de decisão judicial (Lei da ADIN, art. 27 e Lei da ADPF, art. 11) já que ali consta expresso que ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo poderá o STF, por maioria de 2/3 de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração, que é bem o caso aqui cogitado.

Essas considerações obviamente só valem para as ações em curso em que a modulação dos efeitos tenha sido requerida, ou para aquelas ações a serem ainda distribuídas em que tal pedido venha a ser formulado.

Outra hipótese a ser considerada é que em julho/2020 – ou, no máximo, janeiro/2021 – estarão se completando 5 anos desde que as alíquotas foram restabelecidas pelo Decreto 8.426/15.

A partir da referida data, ainda que a declaração de inconstitucionalidade retroaja a 30.04.2004, data da promulgação da Lei 10.865/04, o fisco encontrará obstáculos (decadência) para exigir dos contribuintes o PIS/COFINS à alíquota de 9,25% (Lei 10.865/04, art. 8º, I e II), posto então já ultrapassados 5 anos desde seu restabelecimento.

III – CONCLUSÃO

O STF já reconheceu a repercussão geral desse tema no Recurso Extraordinário 1.043.313 (tema 939), sob relatoria do Ministro Dias Toffoli. Nele será definido se é possível as alíquotas do PIS/COFINS serem reduzidas e restabelecidas por Decreto, nos termos da Lei 10.865/04, art. 27, § 2º. Mas, mesmo a repercussão geral, se favorável aos contribuintes, somente beneficiará aqueles que tenham ajuizado ação.

Com efeito, absolutamente lógico e razoável buscar no Judiciário decisão que reconheça a inconstitucionalidade do disposto no art. 27, § 2º da Lei 10.865/04, o qual embasou o restabelecimento da alíquota, de zero para 4,65% do PIS/COFINS sobre receitas financeiras a partir de julho/2015.

Resta agora responder à pergunta formulada inicialmente: por que voltar a esse tema agora?

Resposta: porque além de já haver importante sinalização do STJ quanto à inconstitucionalidade dessa tributação, o contribuinte, se não obtiver êxito no seu pedido de modulação dos efeitos na decisão do STF confirmatória da inconstitucionalidade, se prejudicado pela retomada da tributação à alíquota cheia de 9,25%, isto impactará seu caixa por se tratar de período ainda não alcançado pela decadência.

De que forma? Nesse caso perderá 4,6% (diferença entre a alíquota pela qual já vem sendo tributado desde julho/2015 – isto é, 4,65% –, e a alíquota de 9,25%) no referido período.

É bem verdade que a sentença, nesse caso, o prejudicará também em relação ao futuro já que a alíquota será então majorada de 4,65% para 9,25%.

Quanto a isso, cabe esclarecer que os fundamentos que amparam a tese dos contribuintes vão além daqueles aqui mencionados porquanto na presente exposição, até aqui, limitamo-nos a discorrer sobre a inconstitucionalidade do dispositivo retrocitado da Lei 10.865/04.

Dentre outros fundamentos a serem levados para a ação, exemplificativamente: a) não devem ser tributadas receitas financeiras por empresas não-financeiras, isto é, que não tenham receitas financeiras como atividade ou objeto principal; b) o tratamento anti-isonômico da lei ao permitir que instituições financeiras deduzam custos e despesas de sua receita, reduzindo indiretamente a alíquota efetiva dessas contribuições, alternativa não oferecida aos demais contribuintes; c) o DL 1598/77 alterado pela Lei 12.973/14 estabelece o conceito de receita bruta como sendo: i) o produto de venda; ii) preço auferido na prestação de serviços; iii) receitas das atividades ou objeto principal da pessoa jurídica, não estando incluídas aí as receitas financeiras.

Desse modo, o objetivo com a ação é ver declarada a inconstitucionalidade integral da exigência do PIS/COFINS sobre receitas financeiras – não se limitando aos anos de 2015 em diante –, ainda porque esse tema, nesse ponto, como exposto atrás, encontra-se sob análise do STF.

Ainda que ocorra reforma tributária que extinga essa tributação ou equivalente a ela, a ser criada, para aqueles que vêm pagando essas Contribuições é possível, como efeito da ação, adicionalmente, a obtenção do direito à repetição/compensação dos valores pagos indevidamente desde julho/2015.

PIS/COFINS Sobre receitas financeiras