DECRETO Nº 10.886, DE 7 DE DEZEMBRO DE 2021
Institui a Estratégia Nacional de Propriedade Intelectual.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84,caput, inciso VI, alínea "a", da Constituição,
D E C R E T A:
Art. 1º Fica instituída a Estratégia Nacional de Propriedade Intelectual - ENPI para o período de 2021 a 2030, na forma disposta no Anexo, com o objetivo de definir ações de longo prazo para a atuação coordenada dos órgãos e das entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, a fim de estabelecer um Sistema Nacional de Propriedade Intelectual efetivo e equilibrado.
Art. 2º São diretrizes da ENPI:
I - o uso da propriedade intelectual como forma de agregação de valor a produtos e serviços e como incentivo à inovação, à criação e ao conhecimento;
II - o uso estratégico da propriedade intelectual em políticas públicas, com vistas a incentivar a competitividade e os desenvolvimentos econômico, tecnológico e social;
III - a sinergia com outras políticas públicas transversais;
IV - a simplificação e a promoção da agilidade dos processos relacionados à propriedade intelectual;
V - o equilíbrio entre a propriedade intelectual, a livre concorrência e o interesse social;
VI - a garantia da segurança jurídica, da transparência e da previsibilidade em propriedade intelectual;
VII - a articulação e a integração de iniciativas entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, em todas as esferas de Governo, com a participação ativa dos atores do ecossistema de inovação e da economia criativa;
VIII - o respeito aos compromissos internacionais em propriedade intelectual; e
IX - a busca contínua de soluções pragmáticas de curto, de médio e de longo prazos, pela administração pública, em alinhamento com uma visão estratégica de futuro.
Art. 3º A ENPI será implementada por meio de planos de ação bienais que conterão ações prioritárias, entregas, prazos e metas.
Parágrafo único. Os documentos referentes à ENPI e seus planos de ação serão atualizados e disponibilizados periodicamente no Portal de Propriedade Intelectual.
Art. 4º O Grupo Interministerial de Propriedade Intelectual - GIPI, de que trata o Decreto nº 9.931, de 23 de julho de 2019, será responsável pela implementação, pelo monitoramento e pela articulação das ações da ENPI.
Art. 5º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 7 de dezembro de 2021; 200º da Independência e 133º da República.
JAIR MESSIAS BOLSONARO
Paulo Guedes
ANEXO
Situação problema
O Sistema Nacional de Propriedade Intelectual - SNPI se apresenta pouco efetivo, ou seja, não tem capacidade plena de fazer ou executar sua missão (eficácia) da melhor maneira possível (eficiência), conforme apontou o diagnóstico do SNPI elaborado pelo Governo, o qual foi detalhadamente descrito no Relatório de Diagnóstico elaborado no âmbito da construção da Estratégia Nacional de Propriedade Intelectual - ENPI.
Os desafios nacionais foram estabelecidos e resumidos em nove macrocausas que contribuem diretamente para o problema da pouca efetividade do sistema dos direitos de Propriedade Intelectual - PI:
I - desequilíbrios nos usos do sistema de PI relacionados à subutilização e à sobreutilização dos direitos de PI;
II - falta de visão estratégica de PI das empresas e dos demais atores do ecossistema de inovação e criação;
III - carência de profissionais com competência em PI;
IV - dificuldade de acesso e complexidade de registro em alguns segmentos de PI;
V - carência de especialização em PI no sistema judiciário;
VI - violação dos direitos de PI;
VII - predominância de ações isoladas de curto prazo e descontínuas do Governo na área de PI;
VIII - pouca estratégia na inserção internacional do Brasil na área de PI; e
IX - necessidade de modernização dos marcos legais de PI.
Objetivos
O objetivo da ENPI é alcançar um SNPI efetivo e equilibrado, que seja amplamente conhecido, utilizado e observado, que incentive a criatividade, os investimentos em inovação e o acesso ao conhecimento, com vistas ao aumento da competitividade e ao desenvolvimento econômico e social.
Para alcançar seu objetivo, a ENPI atuará em sete eixos estratégicos (linhas de ação):
Eixo 1: Propriedade intelectual para a competitividade e o desenvolvimento
Fomentar a geração e o uso estratégico da propriedade intelectual em prol do interesse nacional para a promoção da competitividade e do desenvolvimento de negócios no Brasil e no mundo. As ações deste eixo são direcionadas à geração e à agregação de valor de PI aos bens, serviços e processos, que por sua vez resultarão em maior competitividade e geração de renda contemplando as especificidades e competências regionais.
Eixo 2: Disseminação, formação e capacitação em propriedade intelectual
Promover ações para disseminar a cultura de PI entre agentes econômicos, consumidores, comunidade acadêmica e a sociedade em geral, com o propósito de tornar o sistema e suas ferramentas conhecidas para inventores, criadores, cientistas e empresários, bem como formar e capacitar profissionais de diversas áreas no tema.
Eixo 3: Governança e fortalecimento institucional
Garantir o alinhamento, a articulação e a implementação de ações da ENPI com os objetivos e as diretrizes das políticas de inovação, desenvolvimento, competitividade e cultura, bem como direcionar medidas para reestruturação e fortalecimento das instâncias administrativas responsáveis pelos serviços de PI.
Eixo 4: Modernização dos marcos legais e infralegais
Tornar o ambiente regulatório de PI mais transparente, seguro e previsível em relação às demandas de um mercado global dinâmico e inovador, e, sempre que possível, simplificar procedimentos para facilitar o acesso e o uso do sistema.
Eixo 5: Observância e segurança jurídica
Conscientizar e esclarecer a sociedade a respeito da relevância dos Direitos de Propriedade Intelectual - DPI, incluídas as vantagens de se usufruir dos DPI e os prejuízos decorrentes de sua violação, e da necessidade de promover a sua proteção adequada; fortalecer o ambiente de negócios e a segurança jurídica no Brasil, inclusive no ambiente digital, com medidas voltadas ao melhor aparelhamento e à organização dos órgãos judiciais e de fiscalização; e coordenar ações de repressão às infrações administrativas e penais contra a propriedade intelectual.
Eixo 6: Inteligência e visão de futuro
Fomentar a produção de análises prospectivas sobre o uso da PI, com o propósito de identificar tendências tecnológicas, desafios para a sua proteção sobre novas tecnologias e novas formas de se apropriar de criações protegidas por DPI e estimular o uso das bases de dados para apoiar a inovação e a economia criativa.
Eixo 7: Inserção do Brasil no sistema global de PI
Fortalecer a inserção estratégica do Brasil nos foros internacionais de PI, estimular a presença de produções culturais e de inovações brasileiras no exterior e promover ambiente de negócios doméstico favorável à atração de investimentos estrangeiros.
Prazo de vigência
A ENPI terá um horizonte de dez anos, considerado o período mínimo de vigência para que resultados estruturantes sejam alcançados. Esse período será contado a partir da data de início da sua implementação. Após esse período, serão avaliados os resultados, verificado se o problema e os desafios identificados foram superados e se foram alcançados o objetivo central e os macro-objetivos propostos.
A partir dessa avaliação geral de resultados, será possível decidir pela continuidade ou não da ENPI, com uma visão clara das adequações necessárias e eventuais novas propostas para um próximo período de vigência.
Foram definidas metas diretamente ligadas ao objetivo geral da ENPI e aos macro-objetivos de cada eixo. A fim de se atingir tais metas e avaliar os resultados alcançados, também foram definidos indicadores que facilitam o acompanhamento durante a implementação, bem como a avaliação e o controle da Estratégia após sua execução.
Metas
Com vistas ao aumento da competitividade econômica e da prosperidade nacional, as metas conjecturadas por meio da implementação da ENPI são:
I - ampliação da utilização do SNPI por inventores, criadores, produtores, melhoristas, autores, entre outros, para fins de proteção;
II - captura de valor pela ampliação da comercialização e da exploração de ativos de PI gerados no Brasil;
III - conscientização da sociedade sobre os benefícios dos DPI e dos prejuízos ocasionados pela violação desses direitos;
IV - fortalecimento e expansão das habilidades em PI de gestores e especialistas que atuam em estratégia, negócios, Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (P,D&I) e jurídico do setor produtivo;
V - modernização dos escritórios de PI, com vistas a maior eficiência, simplificação burocrática e melhor custo-benefício no âmbito do sistema de PI;
VI - redução das práticas de contrabando, falsificação, pirataria e demais usos ilegais de ativos intelectuais no Brasil;
VII - ampliação do acesso a serviços de inteligência tecnológica em PI para elaboração de estratégias de P,D&I e de negócios para empresas;
VIII - ampliação do investimento em inovação, em economia criativa e em produtos regionais pelo setor privado em função de um ambiente nacional mais propício, pautado por segurança jurídica, transparência e previsibilidade de DPI; e
IX - aumento da exportação de produtos nacionais e regionais com alto valor agregado em função do uso estratégico da PI como mecanismo para alavancar a competitividade das empresas e produtos brasileiros.
Metas globais
A definição de metas quantificáveis é essencial para a avaliação da eficácia, eficiência e efetividade da ENPI. Considerado o horizonte temporal de dez anos definido para a ENPI, é necessário definir metas correspondentes para a mensuração dos resultados alcançados ao longo e ao final desse período. Cada plano de ação deverá estabelecer metas próprias, com indicadores específicos, que no agregado contribuam para alcançar as metas globais aqui apresentadas. As metas globais conjecturadas para a ENPI até o ano de 2030 são:
I - a contribuição direta de setores produtivos intensivos em propriedade intelectual ao Produto Interno Bruto do Brasil deverá superar trinta por cento1;
II - o percentual de empresas inovadoras que se utilizam de algum método de proteção para a inovação deverá alcançar oitenta por cento2; e
III - o Brasil deverá figurar entre as dez nações com maior número de pedidos depositados para proteção de DPI3.
Indicadores
Os indicadores são ferramentas importantes no contexto de políticas públicas uma vez que permitem: detectar e aferir elementos relacionados a um determinado conceito, fenômeno, problema ou resultado de uma intervenção na realidade; interpretar, de modo mensurável, determinado aspecto de uma realidade construída (ação de governo), de forma a operacionalizar a sua observação e avaliação; e compor um cenário aproximado de algumas dimensões da realidade social vivenciada. Dessa forma, é importante que os indicadores se façam presentes em todas as fases do ciclo de vida de políticas públicas: i) ciclo ex-ante, que compreende o diagnóstico para definição do problema; a proposta (draft) da política e a indicação das referências que se almeja modificar; ii) cicloincurso, para monitoramento e avaliação da execução, revisão dos planos de ação (incluídos projetos estruturantes e ações específicas correspondentes), assim como para detecção e correção rápida de desvios e incongruências; e iii) cicloex-post, para avaliação do alcance das metas, das metas globais, dos macro-objetivos, e dos resultados e impactos verificados nosstakeholders-chave e na sociedade civil.
O Guia Prático de AnáliseEx Ante(2018) recomenda ao menos três tipos de indicadores para subsidiar o monitoramento de políticas públicas (neste caso, da implementação da ENPI), a saber: indicadores de natureza econômico-financeira, social e ambiental; indicadores de gestão do fluxo de implementação (insumo, processo, produto, resultado e impacto); e indicadores de avaliação de desempenho (economicidade, eficiência e efetividade). Cada um dos planos de ação elaborados para a implementação da ENPI deverá identificar indicadores de monitoramento de acordo com essas categorias, para o atingimento de suas metas específicas.
Ao final, espera-se garantir que as ações previstas sejam implementadas conforme o planejado, avaliar se as ações estão gerando os impactos desejados e se a implementação de cada plano de ação contribuiu para gerar impacto nas metas globais definidas para a ENPI. Para a elaboração e coleta de indicadores provenientes de fontes de dados nacionais, o Grupo Interministerial de Propriedade Intelectual - GIPI deverá atuar coordenadamente com as instituições responsáveis identificadas. Propõe-se o monitoramento das fontes de dados e de indicadores para avaliação de resultados da ENPI indicados na tabela.
Tabela. Fontes de dados e indicadores considerados na avaliação dos resultados a serem obtidos com a implementação da ENPI.
Indicadores Internacionais4 | ||
Fonte | Elaboração | Indicador |
Global Innovation Index | Cornell University INSEAD OMPI | Intellectual Property Payments, % total trade (5.3.1) |
Patents by origin/bn PPP$ GDP (6.1.1) | ||
PCT patents by origin/bn PPP$ GDP (6.1.2) | ||
Utility models by origin/bn PPP$ GDP (6.1.3) | ||
Intellectual Property Receipts, % total trade (6.3.1) | ||
Trademarks by origin/bn PPP$ GDP (7.1.1) | ||
Industrial Designs by origin/bn PPP$ GDP (7.1.2) | ||
Global Competitiveness Index | Fórum Econômico Mundial | Intellectual Property Protection (1.15) |
International co-inventions (12.03) | ||
Patent applications per million pop. (12.06) | ||
Trademark applications per million pop. (12.10) | ||
World Intellectual Property Indicators | OMPI | Dados estatísticos mundiais sobre PI |
Indicadores Nacionais | ||
Fonte | Elaboração | Indicador |
Relatório de atividades do INPI | INPI | Dados estatísticos nacionais sobre PI |
Estudo sobre a contribuição econômica de setores intensivo em PI | INPI IPEA MRE ME MAPA SDAPI | Contribuição para o PIB |
Contribuição para emprego e salários | ||
Contribuição para o comércio exterior | ||
Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica (Pintec) | IBGE | Métodos de proteção da inovação |
Relatório FORMICT | MCTI | Proteção da PI por ICTs |
Contratos de tecnologia celebrados por ICTs |
Implementação e monitoramento
A fim de facilitar a implementação e o monitoramento da ENPI, serão propostos planos de ação a cada dois anos, que identifiquem as ações prioritárias, os órgãos e as entidades responsáveis, as previsões orçamentárias e as metas a serem atingidas no curto prazo, com vistas a resultados de longo prazo.
O GIPI será responsável pela governança da ENPI, por coordenar as ações, facilitar a articulação entre os diversos atores e viabilizar a implementação e o monitoramento da Estratégia como um todo.
Além de suas competências gerais já exercidas, serão atribuições do GIPI:
I - prever estrutura organizacional e fluxo de informações e decisões para a governança da ENPI;
II - monitorar a implementação da ENPI e verificar a realização das metas propostas nos planos de ação e reportadas nas suas reuniões;
III - coordenar a articulação dos agentes envolvidos nas ações e sanar eventuais dificuldades de comunicação e concertação durante a execução;
IV - prever medidas de gestão de riscos que evitem desvios das metas e dos objetivos propostos e permitam com que incongruências sejam rapidamente detectadas;
V - solicitar informações e apoio técnico a órgãos e entidades, necessários à implementação da ENPI;
VI - promover reuniões técnicas periódicas para troca de informações e articulação das ações em execução entre os agentes envolvidos;
VII - promover a divulgação das ações da ENPI em alto nível de governo e perante a sociedade;
VIII - elaborar e aprovar os planos de ação a cada dois anos, com previsão da realização de ajustes (se necessários) durante o período de execução; e
IX - estabelecer contato com agentes e entidades externas ao GIPI para realizar consultas, buscar recursos e promover parcerias necessárias à implementação da ENPI.
Os impactos esperados dependerão das ações que serão priorizadas e contempladas no escopo de cada plano de ação, considerando que ações e políticas públicas não conseguem atacar todas as causas a um só tempo.
Existe a necessidade de se articular as ações do SNPI em uma estratégia de longo prazo que considere e administre os eixos estratégicos de maneira pragmática, baseada nas melhores práticas internacionais. É, portanto, importante contar com a efetiva participação dos atores públicos e privados do SNPI e Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação - SNCTI em todas as etapas de execução, implementação, monitoramento e avaliação, como tem sido desde o início do processo de construção da ENPI, para que ela possa alcançar as suas metas e as metas globais conjecturadas para 2030.
Com vistas a garantir o alcance dos objetivos e resultados propostos pela ENPI, algumas medidas serão aplicadas para sua implementação:
I - atribuir responsabilidades e prever iniciativas de reconhecimento aos órgãos e agentes diretamente envolvidos;
II - implementar canais de recebimento de críticas e sugestões da sociedade sobre iniciativas específicas, tanto na fase de elaboração, como de monitoramento, avaliação e revisão dos planos de ação;
III - publicar relatórios de monitoramento para conferir transparência às informações e aos dados de implementação;
IV - realizar, para cada ação detalhada nos planos de ação, planejamento financeiro e meios de custeio para implementação das ações previstas pela ENPI e prever dotação orçamentária para repasses, aplicação de benefícios, incentivos fiscais, contrapartidas e vouchers para determinadas ações pontuadas na ENPI em sinergia com o arcabouço legal existente ou outros novos atos legais;
V - promover a implementação de projetos-piloto de PI, melhorar os vínculos com os programas de setores-chave da economia e firmar parcerias com Estados selecionados para implementação de programas-pilotos;
VI - elaborar documentos orientadores para desenvolvimento e implementação de estratégias de PI regionais, estaduais e municipais;
VII - estabelecer parcerias e treinamentos com agentes locais e especialistas para a consideração das diferenças e potencialidades regionais e setoriais na execução de ações, programas ou projetos; e
VIII - desenvolver documentos orientadores sobre a estratégia de PI no setor da economia criativa ou no setor cultural