Parecer Nº 891/2010

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    Ementa

    A declaração de incostitucionalidade plasmada na Súmula Vinculante n. 21 alcança toda e qualquer lei/ato normativo que, eventualmente, preveja a exigência, por parte de qualquer ente ou órgão da Administração Pública, do depósito ou do arrolamento de bens e valores como condição de admissibilidade de recursos administrativos.

    Informações Adicionais

    Campo Valor
    orgao PGFN/CRJ
    procurador LUANA VARGAS MACEDO
    data 2010-05-07T00:00:00

    Conteúdo


    PARECER
    PGFN/CRJ/Nº 891/2010




      SÚMULA VINCULANTE n. 21. ÂMBITO DE ABRANGÊNCIA. EFICÁCIA. REPERCUSSÃO NA ATUAÇÃO DA PGFN.

    1. A declaração de inconstitucionalidade plasmada na Súmula Vinculante n. 21 alcança toda e qualquer lei/ato normativo que, eventualmente, preveja a exigência, por parte de qualquer ente ou órgão da Administração Pública, do depósito ou do arrolamento de bens e valores como condição de admissibilidade de recursos administrativos.

    2. Como conseqüência da eficácia retroativa da declaração contida na Súmula Vinculante n. 21, encontram-se eivadas de nulidade as decisões proferidas em processos administrativos que, no passado, tenham inadmitido recursos por ausência de depósito/arrolamento prévios, sendo igualmente nulos, por derivação, todos os atos subseqüentes daí decorrentes (p. ex. lançamentos definitivos dos créditos fiscais e a sua posterior inscrição em DAU); entretanto, o reconhecimento dessa nulidade somente poderá ocorrer em tempo próprio, por meio das vias cabíveis.

    3. Em decorrência disso, as unidades da PGFN deverão adotar, conforme o caso, as seguintes providências: (i) cancelar as inscrições em DAU dos créditos fiscais que se enquadrem na situação acima narrada, de ofício ou a pedido, observando-se, em qualquer caso, o prazo de 5 anos para tanto, contado da divulgação da decisão administrativa que inadmitiu o recurso; (ii) formular pedido de extinção da execução fiscal eventualmente já ajuizada a fim de cobrar os créditos fiscais acima mencionados, ou concordar com pedido apresentado, nesse sentido, pelo executado; (iii) se o crédito fiscal ainda não foi inscrito em DAU, devolver o processo administrativo correspondente ao órgão público federal competente, para que este proceda a um novo exame da admissibilidade do recurso antes inadmitido, desde que ainda não tenha decorrido o prazo de 5 anos contado da divulgação oficial da decisão que inadmitiu o referido recurso; (iv) reconhecer a procedência do pedido formulado pelo sujeito passivo em eventual ação que objetive a devolução do valor antes pago, observando-se, contudo, o prazo de 5 anos para o ajuizamento da ação, contado da data da divulgação da decisão administrativa que inadmitiu o recurso.

    I
    Definição do objeto do presente Parecer

     O presente parecer tem por objeto responder aos questionamentos feitos a esta Coordenação-Geral de Representação Judicial (CRJ), da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), por meio de duas consultas, tendo sido a primeira formulada pela Procuradoria-Regional na 3ª Região (PRFN - 3ª Região) e a segunda, por sua vez, pela Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional na 1ª Região/DF (PRFN-1ª Região). Destaque-se, já em sede preliminar, que ambas atendem aos requisitos elencados na Portaria PGFN n. 1.005, de 30 de junho de 2009.

    2. A consulta formulada pela PRFN-3ª Região traz indagações relativas, em síntese, ao âmbito de abrangência da Súmula Vinculante n. 21 (publicada no DOU em 27/11/2009), segundo a qual É inconstitucional a exigência de depósito ou de arrolamento prévios de dinheiro ou de bens para a admissibilidade de recurso administrativo, questionando se seria o referido entendimento sumular também aplicável ao caso do depósito recursal previsto no §1º do art. 636 da CLT.

    3. Já a consulta formulada pela PRFN-1ª Região, por sua vez volta-se para os efeitos, se retroativos ou prospectivos, da Súmula Vinculante 21, indagando o seguinte:
    1) Há notícia de existência de modulação de efeitos da referida Súmula Vinculante pelo STF?
    2)Como proceder nos casos de processos em que, anteriormente, inclusive, a 03/01/2008, houve a negativa de seguimento do recurso por ausência de depósito (nos quais, também, não há o registro de existência de ação judicial pelo contribuinte para a discussão da exigência do deposito)?
    3) Os processos devem ser devolvidos para a RFB, para que haja o encaminhamento dos recursos para julgamento pelo órgão competente?
    4) As inscrições já efetuadas (na situação acima descrita) devem ser canceladas, extinguindo-se, por conseqüência, as execuções fiscais ajuizadas?

    4. Diante da evidente afinidade entre as indagações formuladas nas duas consultas acima mencionadas, que possuem, como verdadeiro pano de fundo, questões relativas à Súmula Vinculante n. 21, as mesmas serão examinadas e respondidas conjuntamente, neste Parecer. Assim, será analisado, primeiramente, o âmbito de abrangência da Súmula Vinculante n. 21 (consulta n. 1) e, em seguida, a sua eficácia (consulta n. 2), após o que já será possível ir um pouco além e definir a repercussão da referida Súmula em relação à atuação da PGFN.

    II
    Considerações preliminares

    5. Antes que se proceda ao exame do objeto do presente Parecer, a saber, a abrangência e os efeitos - retroativos ou meramente prospectivos - da Súmula Vinculante n. 21, impende registrar que, mesmo em momento anterior à edição da referida Súmula, ocorrida em 27.11.2009, já não era mais exigível, como condição de admissibilidade dos recursos interpostos nos autos de processos administrativos fiscais destinados à cobrança de contribuições previdenciárias (doravante denominados de processos administrativo-fiscais previdenciários), o depósito prévio de 30% do crédito fiscal, tal como era previsto nos §§1º e 2,º do art. 126 da Lei n. 8213/91. De igual modo, em momento anterior à edição da Súmula Vinculante n. 21, também já não era mais exigível o arrolamento de bens e valores equivalentes a 30% do crédito fiscal como condição de admissibilidade dos recursos voluntários interpostos nos autos de processos administrativos destinados à cobrança de tributos federais em geral (doravante denominados de processos administrativo-fiscais genéricos), tal como previsto no art. 33, §2º, do Decreto n. 70.235/72 (com a redação dada pelo art. 32 da MP n. 1.669-41/1998, convertida na Lei n. 10.522/2002).

    De fato, no que tange ao depósito prévio para fins de admissão de recurso aviado no âmbito do processo administrativo-fiscal previdenciário, formou-se, antes da edição da Súmula Vinculante n. 21, o seguinte cenário: (i) os dispositivos legais que previam a sua exigência, a saber, os §§1º e 2º do art. 126 da Lei n. 8.213/91, foram revogados, em 3 de janeiro de 2008, pela Medida Provisória n. 413/2008; (ii) além disso, em 06 de fevereiro de 2008, foi publicado, com fulcro no art. 19, inc. II da Lei 10.522/02, o Ato Declaratório n. 1, do Procurador-Geral da Fazenda Nacional, dispensando a apresentação, pelas unidades da PGFN, de contestação/recurso nas demandas judiciais que objetivassem afastar a exigência do depósito prévio previsto nos §§1º e 2º do art. 126 da Lei 8.213/91, o que foi feito tendo em conta as reiteradas decisões do STF no sentido da inconstitucionalidade do referido dispositivo. E, como se sabe, esse Ato Declaratório, por força do que dispõe o §5º do art. 19 da Lei n. 10.522/2002, aplica-se, no que couber, às atividades afetas à Receita Federal do Brasil (de modo a impedir a constituição de créditos tributários relativos à matéria nele prevista, bem como a impor a revisão dos créditos tributários já constituídos); (iii) finalmente, em 15 de junho de 2009, a Receita Federal do Brasil editou o Ato Declaratório n. 31, estabelecendo a não exigência de depósito previamente à interposição de recurso administrativo no âmbito do INSS.

    7. Já no que pertine à exigência de arrolamento de bens/valores para fins de admissão do recurso voluntário interposto nos autos dos processos administrativo-fiscais genéricos, prevista no art. 33, §2º, do Decreto n. 70.235/72 (com a redação dada pelo art. 32 da MP n. 1.669-41/1998, convertida na Lei n. 10.522/2002), esclareça-se que o STF, nos autos da ADIN n. 1976-7, reconheceu a sua inconstitucionalidade, em decisão dotada de eficácia retroativa, publicada em 17.05.2007. Em seguida, a Coordenação-Geral de Dívida Ativa (CDA), da PGFN, editou o Parecer PGFN/CDA n. 1539/2008, em que analisou a repercussão da decisão proferida pelo STF na ADIN n. 1.976-7 em relação às inscrições em Dívida Ativa da União.

    8. À luz do panorama acima exposto, pode-se afirmar, num primeiro momento, o seguinte: (i) desde a entrada em vigor da Medida Provisória n. 413/2008, em janeiro de 2008, deixou de ser exigível o depósito prévio como condição de admissibilidade dos recursos interpostos nos autos de processos administrativo-fiscais previdenciários; (ii) desde a publicação da decisão proferida pelo STF na ADIN n. 1.976-7, ocorrida em 17 de maio de 2007, deixou de ser exigível o arrolamento prévio como condição de admissibilidade dos recursos voluntários interpostos nos autos dos processos administrativo-fiscais genéricos.

    9. Também à luz do que se expôs mais acima, parece correto concluir, num segundo momento, que a inexigibilidade do depósito (então prevista na Lei n. 8.213/91) e do arrolamento (prevista no Decreto n. 70.235/72) prévios opera efeitos retroativos, ou seja, alcança recursos administrativos pretéritos. Explica-se: é que a inexigibilidade do arrolamento prévio deriva da decisão, proferida pelo STF, que declarou a inconstitucionalidade do art. 33, §2º, do Decreto n. 70.235/72, sendo certo que essa declaração ostenta eficácia retroativa; já a inexigibilidade do depósito prévio, inicialmente fundada na revogação dos §§1º e 2º do art. 126 da Lei n. 8.213/91, foi, posteriormente, reconhecida por meio do Ato Declaratório n. 1/2008, sendo igualmente certo que esse Ato produz efeitos retroativos.

    10. Registre-se, aqui, que essa última afirmação (relativa à retroatividade dos Atos Declaratórios expedidos com fulcro no art. 19, inc. II da Lei 10.522/02), decorre do contido no Parecer PGFN/PGA n. 206/2009, que, ao buscar definir o prazo de que dispõe o sujeito passivo para pleitear a devolução de tributo cuja ilegitimidade da cobrança restou reconhecida em Ato Declaratório, certamente assume, como premissa, que os Atos Declaratórios ostentam eficácia retroativa. É que se os Atos Declaratórios apenas se aplicassem aos atos/fatos que lhe fossem supervenientes, não haveria sentido em se falar em devolução dos valores pagos indevidamente em momento anterior à sua edição.

    11. Diante desse quadro, marcado por uma série de decisões judiciais, atos administrativos e, até mesmo, alterações legislativas que, antes mesmo da edição da Súmula Vinculante n. 21, já conduziam à inexigibilidade do depósito (então previsto na Lei 8.213/91) e do arrolamento prévios (previsto no Decreto n. 70.235/72) como condição de admissibilidade de recursos administrativos, ostentando essa inexigibilidade, inclusive, efeitos retroativos, questiona-se: em que medida se pode dizer que a referida Súmula Vinculante trouxe, de fato, sobre o tema, uma situação nova para a Administração Tributária Federal (Secretaria da Receita Federal do Brasil-SRFB, PGFN e Conselho Administrativo de Recursos Fiscais-CARF)?

    12. Conforme restará demonstrado adiante, a Súmula Vinculante n. 21 trouxe uma situação nova para a Administração Tributária Federal apenas na medida em que o seu âmbito de abrangência é bem mais amplo do que o âmbito de abrangência das decisões judiciais/atos administrativos/alterações legislativas antes referidas. Enquanto estas últimas se limitaram a afastar a exigência, inclusive com eficácia retroativa, do depósito (então previsto na Lei 8.213/91) e do arrolamento prévios (previsto no Decreto n. 70.235/72) como condição de admissibilidade de recursos administrativos interpostos no âmbito específico, respectivamente, dos processos administrativo-fiscais previdenciários e dos processos administrativo-fiscais genéricos, a Súmula Vinculante vai além, aplicando-se a uma gama muito maior de situações.
     
    13. É exatamente o que será visto adiante.
    III
    Exame do objeto do presente Parecer

    a) Consulta n. 1: âmbito de abrangência da Súmula Vinculante n. 21

    14. Com a edição da Súmula Vinculante n. 21, a inexigibilidade do depósito/arrolamento prévios para fins de admissão de recursos administrativos deixou de estar restrita aos recursos interpostos nos autos, especificamente, dos dois processos administrativos de que tratam a Lei n. 8.213/91 e o Decreto n. 70.235/72, passando a se aplicar aos recursos interpostos nos autos dos processos administrativos em geral.

    15. Com efeito, dispõe a Súmula Vinculante n. 21 que É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou de bens para a admissibilidade de recurso administrativo. Trata-se de uma inconstitucionalidade material, de modo que, de acordo com a literalidade da referida Súmula, percebe-se que o entendimento nela contido se aplica, indiscriminadamente, aos recursos administrativos aviados em sede de processos desenvolvidos no âmbito de qualquer órgão ou ente da Administração Pública.

    16. É certo, todavia, que, conforme muito bem lançado no Parecer PGFN/CRJ/CDA n. 1437/2008 (em que se abordou, dentre outros temas, os da extensão e eficácia da Súmula Vinculante n. 8), a definição do âmbito de abrangência das Súmulas Vinculantes, com a fixação do seu real conteúdo vinculante, deve, necessariamente, passar pela análise em torno dos fundamentos determinantes dos precedentes judiciais, do STF, que lhe antecederam e lhe ensejaram a edição, não devendo, diversamente, ater-se unicamente ao que está contido na literalidade do seu texto. Vale conferir, a esse respeito, elucidativo trecho do mencionado Parecer:
    Significa dizer que a adequada aplicação da súmula vinculante pressupõe a busca dos motivos que lhe determinaram a edição e que também são albergados pela força obrigatória, revelando, nessa toada, o conteúdo e a extensão do entendimento da Corte. (...).
    Ao revés, considerar como vinculante tão-somente o texto do enunciado sumular significaria abstrair indevidamente todo o seu substrato jurisprudencial, redundando no esvaziamento da força normativa decorrente da atividade hermenêutica do Supremo Tribunal Federal.

    17. Nessa linha, analisando-se as decisões, oriundas da STF, que redundaram na edição da Súmula Vinculante n. 21, constata-se que o fundamento que se mostra subjacente às mesmas (o seu fundamento determinante) é, basicamente, o de que a postura, adotada pela Administração com base em algumas leis/atos normativos, de condicionar a admissão de recursos administrativos ao depósito ou ao arrolamento de bens e valores, pelo contribuinte ou administrado (doravante denominado sujeito passivo), ofende o direito de petição assegurado a todos, em âmbito administrativo ou judicial, pela Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, inc. XXXIV, bem como a garantia do contraditório, também assegurada constitucionalmente.

    18. E, nessas decisões, o STF examinou dispositivos de não apenas uma, mas de várias leis/atos normativos que veiculavam tal exigência, tendo reconhecido a inconstitucionalidade de todos eles, pelo mesmo fundamento. Nesse sentido, à guisa de exemplo, foram examinados e considerados inconstitucionais pelo STF, em controle difuso de constitucionalidade, o art. 126, §§1º e 2º, da Lei Federal n. 8.213/91, o art. 250 do Decreto-lei estadual n. 5/75, do Estado do Rio de Janeiro, o art. 19, caput, da Lei federal n. 8.870/94 e o art. 636, §1º da CLT, dentre outros.

    19. Assim, o conteúdo vinculante da Súmula ora sob comento alcança toda e qualquer lei/ato normativo que, eventualmente, preveja a exigência, por parte de qualquer ente ou órgão da Administração Pública, do depósito ou ao arrolamento de bens e valores como condição de admissibilidade dos recursos administrativos aviados pelos sujeitos passivos, não se restringindo, portanto, ao art. 126, §§1º e 2º da Lei n. 8.213/91 e ao art. 33, §2º do Decreto n. 70.235/72 (com a redação dada pelo art. 32 da MP n. 1.669-41/1998, convertida na Lei n. 10.522/2002).

    b) Consulta n. 2: efeitos - ex tunc ou ex nunc - da Súmula Vinculante n. 21

    20. Para que bem se responda a questão objeto do presente tópico (eficácia da Súmula Vinculante n. 21), impende se reportar às considerações contidas no Parecer PGFN/CRJ n. 391/2009, - ao qual, desde já, remete-se o leitor-, em que se analisou, dentre outros, o tema da natureza jurídica e eficácia das Súmulas Vinculantes. Nesse Parecer, a CRJ concluiu, fundada em argumentos atinentes à natureza jurídica das Súmulas Vinculantes, que as mesmas, quando enveredam pelo reconhecimento da inconstitucionalidade de uma determinada lei, produzem, ao menos em regra, efeitos retroativos, à semelhança, aliás, do que se passa com as decisões do STF dadas em controle concentrado e difuso de constitucionalidade. Confira-se um dos seus trechos:

    18. Essa natureza de mecanismo, ou método, a serviço do controle de constitucionalidade das leis determina que as Súmulas Vinculantes produzam efeitos similares àqueles naturalmente irradiados pelos demais mecanismos de controle de constitucionalidade. Isso significa que o entendimento plasmado nas Súmulas Vinculantes produz, como já foi oportunamente assinalado, efeitos gerais, erga omnes, que vinculam os futuros julgamentos sobre a mesma questão constitucional, a exemplo do que tradicionalmente ocorre com as decisões do STF proferidas em controle concentrado de constitucionalidade das leis, e, ainda, a exemplo do que se vislumbra que também ocorrerá com as decisões proferidas em sede de controle difuso ( isso se restar confirmada a tendência de absorção, pela ordem jurídica pátria, do já referido fenômeno da objetivação do sistema de controle de constitucionalidade das leis.)

     19. Isso significa ainda, e eis aqui ponto importante ao presente estudo, que as Súmulas Vinculantes, também à semelhança do que se passa com as decisões do STF dadas em controle concentrado e difuso, possuem, ao menos em regra, efeitos retroativos. Ou seja: a interpretação constitucional contida na Súmula, mormente aquela que envereda pelo reconhecimento da inconstitucionalidade de determinada lei, possui eficácia ex tunc, retroagindo, nesse caso, até o momento da edição da lei tida por inconstitucional, salvo se o STF lhe conferir eficácia prospectiva, tal qual permitido pelo art. 4º da Lei 11.417/06.

    21. Em complemento aos argumentos contidos no mencionado Parecer, que conduzem à conclusão quanto à retroatividade dos efeitos emanados das Súmulas Vinculantes, cabe, aqui, expor mais um, que apenas corrobora tal conclusão: é que o conteúdo e os efeitos das Súmulas Vinculantes, a princípio, guardam verdadeira relação de simetria com o conteúdo e os efeitos das decisões judiciais, proferidas pelo STF, que lhes antecederam e lhes ensejaram a edição.

    22. De fato, as Súmulas Vinculantes, conforme bem frisado no Parecer PGFN/CRJ n. 391/2009, são o resultado da interpretação reiteradamente assumida, pelo STF, acerca de determinada questão de índole constitucional, manifestada em julgamentos proferidos, no mais das vezes, em sede de controle difuso de constitucionalidade das leis. O entendimento assumido pelo STF nesses julgamentos, cuja eficácia, a princípio, estaria restrita às partes das demandas (eficácia inter partes), uma vez plasmado em Súmula Vinculante, passa a ostentar alcance geral, vinculando não apenas todo Poder Judiciário (ou seja, determinando o resultado de futuras demandas que tenham por objeto a questão sumulada), mas, também, todos os órgãos e entes da Administração Pública (eficácia geral).

    23. Assim, as Súmulas Vinculantes reproduzem o conteúdo dos julgamentos reiterados proferidos pelo STF acerca de uma dada questão constitucional, conferindo a esse conteúdo uma característica que antes lhe era estranha: a força vinculante geral; eis, aí, a função, por assim dizer, mais visível ou notória das Súmulas Vinculantes. E quando o conteúdo desses julgamentos e, portanto, da Súmula Vinculante, for a declaração de inconstitucionalidade de determinada lei/ato normativo, os efeitos dela decorrentes serão, em regra, retroativos, como, no mais, ocorre em relação a todas as declarações de inconstitucionalidade proferidas pela Suprema Corte, quer em sede de controle concentrado, quer em sede de controle difuso de constitucionalidade.

    24. A retroatividade do conteúdo declaratório contido naquelas Súmulas Vinculantes que reconhecem a inconstitucionalidade de leis apenas não ocorrerá na hipótese de o STF, expressamente, dispor em sentido diverso, modulando os efeitos dessa declaração, de modo a lhes imprimir força meramente prospectiva. E essa modulação, sempre fundada em razões atinentes à segurança jurídica e ao excepcional interesse público, poderá ser feita, pelo STF, em um dos dois momentos a seguir referidos: (i) por ocasião da decisão plenária de edição da Súmula Vinculante, nos termos permitidos pelo art. 4° da Lei n. 11.417/2006; (ii) já no próprio julgamento dos recursos que antecederam a edição da Súmula, com fulcro no art. 27 da Lei n. 9.868/99, - cuja aplicação, originariamente restrita às declarações de inconstitucionalidade proferidas em sede de controle concentrado de constitucionalidade, tem sido estendida, pelo STF, àquelas dadas em controle difuso.

    25. Nesse ponto, faz-se um breve parênteses para voltar as atenções à Súmula Vinculante n. 8, segundo a qual São inconstitucionais o parágrafo único do art. 5º do Decreto-lei 1569/77 e os artigos 45 e 46 da Lei 8212/91, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário, eis que a mesma se apresenta como um bom exemplo de como o tema da eficácia das Súmulas Vinculantes vem sendo tratado pelo STF. É de se notar, desde logo, que a Suprema Corte, por ocasião do julgamento dos recursos extraordinários que antecederam a edição da referida Súmula, reputou conveniente, diante da presença de razões de segurança jurídica e de relevante interesse público, aplicar o art. 27 da Lei n. 9.868/99 e modular os efeitos da declaração de inconstitucionalidade dos arts. 45 e 46 da Lei n. 8212/91, especificamente para afastar a possibilidade de devolução dos valores pagos, no passado, fora dos prazos qüinqüenais, de decadência e de prescrição, previstos nos arts. 173 e 174 do CTN, ressalvadas aquelas hipóteses em que o pedido de devolução tivesse sido formulado pelo contribuinte, em sede administrativa ou judicial, em data anterior à 11.06.2008 (data do julgamento dos mencionados RE´s).

    26. Ou seja: no julgamento dos recursos extraordinários, o STF conferiu efeitos ex nunc à declaração de inconstitucionalidade dos referidos dispositivos legais, com o fim específico de evitar que os valores pagos anteriormente, com base nas leis tidas por inconstitucionais, tivessem que ser devolvidos aos contribuintes; por outro lado, vale observar que tal devolução seria impositiva caso a declaração de inconstitucionalidade operasse os efeitos que lhe são naturais, ou seja, efeitos retroativos.

    27. Importa notar, e eis aqui ponto essencial à presente análise, que a Súmula Vinculante n. 8, ao reproduzir, com eficácia vinculante geral, o conteúdo do julgamento dos mencionados recursos extraordinários, a saber, a declaração de inconstitucionalidade do art. 5º do Decreto-lei 1569/77 e dos artigos 45 e 46 da Lei 8212/91, passou a ostentar os mesmos efeitos, conferidos pelo STF, a tal conteúdo declaratório, ou seja, efeitos ex nunc no que toca aos valores já pagos anteriormente, a título de contribuições previdenciárias, fora dos prazos qüinqüenais previstos no art. 173 e 174 do CTN. Exatamente por isso, essa declaração de inconstitucionalidade, que, por estar plasmada em Súmula Vinculante, é de observância cogente para todos os órgãos e entes da Adm

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