A contabilidade de conteúdos pagos

Criado em 08/08/2023
Publicado em 09/08/2023

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Você em algum momento já deve ter ouvido falar sobre plataformas de streaming relacionados à criação de conteúdos pagos, que alcança, especialmente, a chamada indústria do prazer. E sobre as possibilidades que isso abre ao contador? Pois bem, estou aqui para te contar que esse mercado existe e movimenta bilhões de dólares em royalties, cessão de direitos, marcas e patentes, transferências internacionais etc.

Segundo a CEO da plataforma de streaming Only Fans, Amrapali Gan, durante sua apresentação no Web Summit, ocorrida no Rio de Janeiro em maio de 2023, a rede social de conteúdo adulto atingiu a marca de 10 bilhões de dólares em repasse para criadores de conteúdo, desde sua criação em 2016. Em 2023, esse número já se enquadra em 4 bilhões de dólares, num crescimento exponencial que quase dobrou em relação a 2022.

O modelo de negócio, em quase sua totalidade, é bem simples, onde o produtor do conteúdo fica com a maior fatia desse faturamento (80% para o produtor de conteúdo e 20% para a plataforma), sem anúncios ou interrupções, o que pode provocar um outro modelo de negócio, que seria a venda de anúncios indiretos dentro da própria página do produtor, e direcionada exclusivamente ao seu assinante.

Apesar disso, há um certo preconceito com processos necessários ao suporte de ganho desses produtores de conteúdo adulto, tais como, gestão financeira, contabilidade e administração de bens e recursos. Segundo o estudo publicado na monografia “The Social Costs of Pornography: A statement of finding and recommendations”, ou simplesmente, traduzido para o português, “Os custos sociais da pornografia”, esse segmento movimenta algo em torno de 100 bilhões de dólares, e lucra, com suas produções, valores maiores que as robustas produções Hollywoodyanas, algo em torno de 15 bilhões de dólares, superando valores operados pela NBA, NFL e Netflix, por exemplo.

Pois bem, como é comum ocorrer, máquinas de ganhar dinheiro também se tornam máquinas de propaganda. Há anos essa gigantesca indústria tenta defender que o uso da pornografia é inofensivo ou mesmo benéfico. Desse modo, um novo segmento empresarial surge com voracidade e, desde então, novas formas de gestão, o que inclui equipes multidisciplinares envolvendo advogados, administradores, assessores de mídia, gestão de pessoas e, por que não, contadores.

Nesse contexto, estratégias corporativas passam a ser mais bem elaboradas para se chegar ao ponto de equilíbrio financeiro e econômico, buscando alavancagem, distribuição de conteúdo para um número “X” de pessoas e expansão das atividades junto a um determinado período.

Por oportuno, surge a figura de profissionais tão acostumados com métricas de lucratividade, rentabilidade, planejamento tributário, equivalência patrimonial, análise de custos, operações de folha de pagamento, escriturações fiscais, apuração de impostos e auxílio na tomada de decisões, como qualquer outro segmento. Todavia, direcionada à chamada “indústria do prazer”, que ainda é vista com parcimônia e desdém, além da criação de tabus e preconceitos.

No entanto, por ser um segmento que envolve milhões de dólares ao ano, passou a ser um nicho a ser explorado, sobretudo dentro da atividade voltada para a ciência que estuda o patrimônio. No caso, estamos a falar da ciência contábil e do papel do contador para esse fim.

Nota-se que há das mais diversas possibilidades de negócios a serem direcionadas, tais como o uso do CNAE 63.19-4-00 (portais e provedores de conteúdo e outros serviços de informação da internet), que inclusive pode estar vinculada ao Simples Nacional no Anexo III sujeitas ao Fator R e, possivelmente no Anexo V, caso possua Fator R inferior a 28%, conforme inciso VI, do § 5º-M, do art. 18 da LC nº 123/2006.

Além disso, pode se incluir atividades como gravação de som e de edição de música, provocadas para as edições nas plataformas que remuneram a produtora de conteúdo com a música disponibilizada para direcionar a produção, chamadas músicas incidentais ou de forma cognoscível chamada de “músicas de fundo” (CNAE 59.20-1-00), Anexo III, não sujeitas ao Fator R.

Outras atividades, como edição de livros (comercialização de edições de exemplares contendo conteúdo exclusivo), que se destaca pelo uso da imunidade do ICMS (art. 150 – CF) com o uso do CNAE 73.19-0-99 – Outras atividades de publicidade não especificadas anteriormente, que também pode ser explorada pelo Anexo III do Simples Nacional, sem uso do Fator R, direcionada principalmente, para publicações de patrocinadores, recebimentos de royalties e Adsense, que é o serviço de publicidade oferecido pelo Google.

Perceba o quão vasto são as atividades desse mercado, que por sua vez, por ser um sistema de exploração global, acarreta, entre outras coisas, na exportação do serviço ou criação de novos modelos de negócios, tais como, o uso de marcas e patentes sobre produtos destinados ao seu usuário, inteligência artificial para interação com os produtores de conteúdo e patrocínio de marcas, gerando dentro da plataforma a comercialização dos seus produtos.

Assim, teremos a incumbência de fazer a gestão desses produtores de conteúdo adulto, seja na busca pela profissionalização e consequentemente no aumento de receita, estímulo econômico e potencial de crescimento. As estruturas de trabalho ainda são bem embrionárias e desconhecida para muitos profissionais, seja pelo tabu a enfrentar, ou pelo mero desconhecimento de como funciona. No entanto, funciona como uma propulsora de desenvolvimento de negócios, pois há uma certa verticalização dos negócios, principalmente iniciada pela produção do conteúdo, passando pela disponibilização de produtos, royalties e até mesmo, outras plataformas incidentes sobre a produtora do conteúdo, no qual exemplifico.

A plataforma de conteúdo disponibiliza o acesso, no qual, a produtora insere suas fotos e/ou vídeos. A medida em que ela adquire usuários pagantes ao seu conteúdo, outras empresas se vinculam à produtora, tais como lojas de acessórios femininos, de produtos eróticos, de ensaios fotográficos, produção de vídeos exclusivos e participações. Além disso, a impulsão do conteúdo a outras plataformas gera os famosos Adsense ou royalties sobre o produto disponibilizado. Outros sites e plataformas de conteúdo adulto pagam para usar seu nome e conteúdo, com alcance mundial, o que pode ocasionar a exportação do serviço e a consequente tributação sobre esse contexto. Em alguns casos, são necessárias medidas para poder viabilizar a entrada desses recursos no País ou até mesmo repatriar valores.

Ato contínuo, para toda essa movimentação, existirá o consequente aumento de patrimônio, no qual provocará a obrigatoriedade da declaração do Imposto de Renda ou até mesmo, de informar ao Fisco recebimentos acometidos no Exterior, o que possibilita, inclusive, a participação do contador de forma estratégica, como o uso de estruturas societárias como offshores ou trustes, e medidas que possam insurgir em benefícios ao produtor de conteúdo e sua organização.

O mercado de produção de conteúdo adulto está em constante crescimento no Brasil e no mundo. Com um celular e uma plataforma para distribuição, os produtores desses conteúdos conseguem ótimos rendimentos.

Mas ainda há um pensamento errôneo e muito comum entre esses produtores de conteúdo que é, por se tratar de algo sigiloso, que não haverá fiscalização com relação aos valores recebidos pelas plataformas.

Contudo, esse pensamento é totalmente enganoso, pois com a tecnologia, fica impossível escapar da Receita Federal, visto que as movimentações financeiras são feitas por plataformas e bancos digitais. O uso de ferramentas de gestão para alavancar usuários junto ao “tráfego pago” ou “tráfego orgânico”, bem como a natureza da informação ao Fisco e estar distante de malhas fiscais ou auditorias da Receita, forçam a profissionalização de sua estrutura e a busca por profissionais para auxílio.

Mediante o exposto, certamente surgem muitas dúvidas e/ou questionamentos, sobretudo à atuação do profissional contábil sobre esse nicho de negócios. Fica evidente, no entanto, que se trata de um segmento em expansão. E por ser abrangente e ainda pouco explorado, seja pelo conservadorismo em associar a profissão a este ambiente, seja pela obscuridade e sigilo de informações ou, até mesmo, por ser desconhecido da maior parte dos profissionais, mostra-se como muito promissor, não só para os criadores de conteúdo, mas também para os profissionais da contabilidade.

A contabilidade de conteúdos pagos