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Consultor Tributário.
Criado em 07/2025
Publicado em 17/07/2025
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1 – INTRODUÇÃO
Quando deparamos com os casos de redução de capital observamos que, tanto nas sociedades anônimas quanto nas limitadas as hipóteses passíveis de redução do Capital Social são parecidas. Além disso, assim como na constituição e/ou aumento, é admitido que a redução (devolução) do Capital Social ocorra através de dinheiro, bens ou direitos.
A devolução de capital social é um instituto jurídico que ocorre, geralmente, em decorrência da redução do capital social ou retirada de sócio de uma sociedade. Embora a devolução em dinheiro seja a forma mais comum, é perfeitamente possível – e legal – que a devolução se realize em bens ou direitos. Esta modalidade, porém, exige atenção especial quanto aos seus efeitos jurídicos, contábeis e fiscais.
2 – OS FUNDAMENTOS JURÍDICOS NA DEVOLUÇÃO DE CAPITAL EM BENS OU EM DIREITOS
Consultando a nossa legislação societária brasileira permite a devolução de capital em bens ou direitos, desde que respeitados os requisitos legais.
2.1 – No Código Civil
O artigo 1.031 do Código Civil dispõe:
“O sócio pode retirar-se da sociedade […] e terá direito à devolução do valor de sua quota, apurado em balanço especialmente levantado para esse fim.“
Embora o artigo mencione “valor”, ele não impõe que a devolução seja necessariamente em dinheiro. Assim, a jurisprudência e a doutrina aceitam que a entrega de bens ou direitos equivalentes é legítima, desde que haja concordância das partes ou previsão no contrato social.
2.2 – Nas Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/76)
No caso de sociedades anônimas, a devolução de capital deve observar as regras do artigo 173 da Lei das S.A.:
“A restituição de capital ao acionista é vedada, salvo nos casos de redução do capital devidamente deliberada pela assembleia-geral.“
Em ambos os regimes, a operação deve respeitar os princípios da isonomia entre sócios, preservação do capital social e proteção a credores.
3 – ASPECTOS CONTÁBEIS
Contabilmente, a devolução de capital em bens ou direitos exige:
a – Avaliação dos bens a valor justo;
b – Registro da baixa do investimento do sócio;
c – Apuração de eventual ganho ou perda na entrega dos bens (comparação entre valor contábil e valor de mercado do ativo).
d – De acordo com o Parecer Normativo CST nº 69/1977, o valor de mercado é aquele:
1 – O valor normal e corrente, conhecido por quem milita no ramo, ou constatado por meio de publicações especializadas; ou
2 – O valor que seria alcançado se o imóvel fosse alienado à vista, levando-se em conta o seu estado físico, localização, desgaste, previsão de vida útil ou outros aspectos pertinentes; ou
3 – O valor obtido mediante avaliação de órgãos especializados, públicos ou privados, ou mesmo de qualquer pessoa física ou jurídica, que comprove habilitação técnica e de reconhecida idoneidade.
Exemplo contábil:
Se a empresa devolve um imóvel com valor contábil de R$100.000,00, mas com valor de mercado de R$180.000,00, deverá reconhecer uma receita (ganho de capital) de R$80.000,00 para efeitos fiscais.
4 – ASPECTOS TRIBUTÁRIOS
A devolução de capital social em bens ou direitos tem importantes consequências tributárias, tanto para a empresa quanto para o sócio.
4.1 – Tributação na Pessoa Jurídica
O verdadeiro manual do IR da RFB que é a Instrução Normativa RFB nº 1.700/2017, em seu art. 208:
“Na devolução de capital mediante entrega de bens, será apurado ganho ou perda correspondente à diferença entre o valor contábil do bem e o valor da entrega.“
Ou seja, eventual ganho apurado deverá ser tributado pelo IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, conforme o regime tributário da empresa (Lucro Real ou Presumido).
4.2 – Tributação na Pessoa Física
Para o sócio pessoa física, aplica-se o art. 23 da Lei nº 9.249/1995:
“Na hipótese de devolução de capital em bens, considera-se como valor de alienação o valor contábil da participação devolvida, sendo apurado ganho de capital sobre a diferença entre esse valor e o valor de aquisição da quota.“
Assim, eventual ganho de capital deverá ser declarado e tributado conforme a tabela progressiva do imposto de renda.
Vale ressaltar que, no caso a devolução do Capital Social seja realizada pelo valor contábil dos bens ou direitos não haverá nenhum efeito tributário, nem para a pessoa jurídica que efetuar a devolução nem para o titular, sócio ou acionista que estiver recebendo os bens ou direitos em devolução.
Nesse caso, o titular, sócio ou acionista deverá registrar os bens ou direitos recebidos:
a. na sua escrituração, se pessoa jurídica, pelo valor contábil da participação societária extinta;
b. na sua declaração de bens correspondente ao ano-calendário da devolução, se pessoa física, pelo valor contábil dos bens.
Registra-se que a devolução de Capital Social pelo valor contábil dos bens ou direitos não configurará distribuição disfarçada de lucros. É o que se pode ver na Decisão abaixo:
DECISÃO Nº 32 de 03 de Março de 1999
ASSUNTO: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ
EMENTA: DISTRIBUIÇÃO DISFARÇADA DE LUCROS. Não se configura distribuição disfarçada de lucros a entrega, pelo valor contábil, de bens e direitos da pessoa jurídica a título de devolução de participação no capital social, na forma do art. 22 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995.
Base Legal: Art. 22, §§ 2º e 3º da Lei nº 9.249/1995; Art. 60, §§ 2º e 4º da Instrução Normativa SRF nº 11/1996 e; Decisão nº 32/1999.
4.3 – ITBI e Outros Tributos
Se o bem devolvido for imóvel, pode incidir ITBI (Imposto de Transmissão de Bens Imóveis), exceto se a devolução se der no âmbito de extinção da sociedade sem exceder o valor da participação.
Na CFB/1988, está previsto em seu art. 156, § 2º, I, da CF/88:
“O ITBI não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão decorrente de devolução de capital, salvo se, neste caso, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos.“
O texto constitucional é bem claro, não necessitando de interpretação.
5 – OS PROCEDIMENTOS PRÁTICOS E SUAS CAUTELAS
a – Avaliação justa dos bens:
Recomendável que seja feita por laudo técnico, para evitar autuações fiscais.
b – Deliberação societária formal:
A devolução deve ser aprovada em reunião/assembleia e registrada na Junta Comercial.
c – Contrato de transferência de bens/direitos:
Pode ser necessário lavrar escritura pública (no caso de imóveis) ou cessão formal (no caso de direitos).
d – Atualização do contrato social (LTDA) ou do estatuto (S.A.).
5.1 – Se Sócio For Pessoa Jurídica:
No caso do titular, sócio ou acionista que receber os bens ou direitos, avaliados a preço de mercado, em devolução de sua participação no Capital Social seja pessoa jurídica:
a. deverá registrar os bens recebidos com o mesmo valor de mercado pelo qual tenham sido avaliados pela pessoa jurídica que devolveu o Capital, tendo como contrapartida:
i. o valor da participação societária extinta, até o seu respectivo valor contábil;
ii. a conta de resultado, pela parcela que exceder ao valor da participação societária extinta.
b. a diferença a maior entre o valor de mercado dos bens ou direitos recebidos e o valor contábil da participação societária extinta:
i. poderá ser excluída do Lucro Líquido para determinação do Lucro Real e da Base de Cálculo (BC) da CSLL, no caso de pessoa jurídica submetida ao regime de tributação com base no Lucro Real;
ii. não será computada na Base de Cálculo (BC) do IRPJ nem da CSLL da pessoa jurídica submetida ao regime de tributação com base no Lucro Presumido ou Arbitrado.
6 – JURISPRUDÊNCIA SOBRE O TEMA
a – STJ – REsp 1.353.111/SP:
Que reconheceu a legalidade da devolução de capital em bens, desde que atendidas as formalidades legais.
b – CARF, Acórdão nº 1301-002.148 (2019):
Reforça a necessidade de apuração do ganho de capital na devolução em bens a sócio pessoa física.
7 – CONCLUSÃO
Diante do exposto podemos concluir que a devolução de capital social em bens ou direitos é juridicamente válida e viável, porém exige cuidados formais e contábeis rigorosos. Deve-se observar os reflexos fiscais tanto na empresa quanto no sócio, prevenindo riscos de autuações. A correta estruturação da operação, com respaldo documental e contábil, é essencial para sua legitimidade e eficiência tributária.
REFERÊNCIAS:
Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
Lei das Sociedades por Ações. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976.
Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995.
Constituição Federal de 1988.
RFB, Instrução Normativa nº 1.700/2017.
STJ – Recurso Especial nº 1.353.111/SP.
CARF – Acórdãos diversos.